Desde que li o pequeno livro “Lições elementares de Xadrez”, escrito por José Raúl Capablanca durante os anos 1940/41, editado pela primeira vez na Espanha em 1947, este não me saiu mais da cabeça. Foi um de meus primeiros livros favoritos de xadrez publicado em idioma espanhol.
Na introdução, trata do tema: O que é o Xadrez?
Aqui, explica com palavras simples e compreensíveis as vantagens e privilégios da aprendizagem do Xadrez, dirigindo-se ao grande número de calouros e jovens indecisos.
Talvez por causa deste livrinho, ou talvez por essa serenidade que refletia seu rosto; talvez ainda pela magia de suas partidas, suas belas combinações sem fogos de artifício, sua imagem de “valentino” dos anos 30, tão perto do cinema negro, ou de um Humphrey Bogart no filme que quase tem seu nome, me aproximaram dele. Não sei se porque desprendia-se dele esse carisma que tem um herói que se converte em lenda, ou porque sempre me seduziu o branco e preto das fotografias antigas: ou… enfim, por tudo isso, ou talvez por outros motivos…
Finalmente, o que aconteceu foi tão singelo que me decidi a viajar a Cuba em companhia de meu filho e melhor amigo “procurando Capablanca”.
Aos fiéis leitores quero poupar-lhes as circunstâncias da longa viagem e irei diretamente ao ponto:
Para poder chegar ao cemitério, tivemos que atravessar “o parque de John Lennon”.
Ao famoso intérprete musical dedicaram ali um monumento comemorativo. Era uma época aquela, quando o grupo musical “The Beatles” tocava uma música moderna, que entusiasmava todo mundo, mas em Cuba era recusada pelo regime ditatorial como música pervertida.
No entanto, quando a banda musical se separou e John Lennon criticou abertamente ao governo americano por sua guerra com o Vietnã, como sabem o que acontece em decorrência dessas atitudes, conseguiram que o regime ‘castristra’ mudasse de opinião e subitamente desse um giro de 180 graus, dedicando um parque a John Lennon.
A figura de bronze de tamanho natural está sentada de forma descontraída num banco do parque:
Pedimos-lhes que observem o cravo, depositado com afeto em seu regaço...
Depois de um curto descanso, continuamos nosso caminho:
Bonita entrada, não é verdade?
Aqui lhes apresentamos a impressionante Necrópole denominada Cristóvão Colombo:
Este cemitério conserva mais história do que muitos livros, especialmente de matemática.
Seria supérfluo nomear-lhes todas as personalidades conhecidas que encontraram neste lugar seu eterno descanso:
Escritores, políticos, cientistas, atores/atrizes e gente honorável da cidade.
Desbordantes mausoléus, monumentos variados, inclusive um dedicado aos famosos jogadores de beisebol; ou uma magnífica reprodução de “La Piedad” de Michelangelo:
O sol daquela manhã e o albor dos mármores exerciam uma luminosidade exasperante que quase feria os olhos.
Infelizmente, não nos encontramos com nenhum visitante que chorasse a morte de alguém próximo, de tal forma que nos vimos obrigados a procurar o caminho por nossa conta.
Não foi fácil encontrar, entre tantas filigranas, nosso venerado primeiro mestre.
Foi como uma explosão!
Sabem esses momentos em que descobrimos algo que sentimos desde sempre de forma inconsciente, mas que, ao toparmos com isso, compreendemos que sempre esteve ali esperando-nos, e era só uma questão de tempo ou alguma sorte localizá-lo?
É a sensação do encontro definitivo, que ficará marcado para sempre.
Agora nos encontramos diante dele:
A representação não era nem cruz nem anjo, mas estilizada e erguida figura em branco poroso.
Como não?
Tinha de ser um Rei, o Rei daquele macabro tabuleiro que tinha esquecido as casas escuras.
Não tombado, mas como que disposto a mover-se agilmente entre as lápides albinas; descobrindo, uma vez mais, como era capaz de burlar a morte.
Com que inteireza, com que domínio da tática, que estratégia ao situar-se….para achar a vitória, inclusive a si mesmo.
Estivemos um longo momento. Detivemos-nos pensando em sua imagem; quiçá também um pouco decepcionados por ter finalmente atingido nosso sonho.
Lentamente nos demos conta de que não tínhamos encontrado Capablanca, senão, muito ao contrário, só uma apócrifa representação de seu continente.
Não podia ser. Não, ali não estava o Capablanca que procurávamos. Somente seu corpo, que, talvez, estivesse disposto uma vez mais a realizar uma inteligente posição com muito primor no tabuleiro, que conduz finalmente à merecida vitória.
Mal nos podíamos separar dele. Pela última vez, pusemos nossas mãos sobre o mármore branco e tivemos que fazer um grande esforço interior para empreender o doloroso regresso…
A seguir algumas imagens de sua vida e resultados dos torneios mundiais
Capablanca vs Lasker . Campeonato mundial 1921. La Habana. Cuba
FINAL: Lasker 6; Capablanca 9 (10 empates).
Lasker abandona quando restam 10 partidas a serem disputadas
Capablanca 1922 Foto: endgame.nl
Capablanca vs Alekhine. 1927. Buenos Aires. Argentina
FINAL: Alekhine 6; Capablanca 3 (25 empates).
Capablanca com sua segunda esposa Olga Chagodaev
Capablanca em 1936
Gemalt von Elke Rehder © Elke Rehder Fine Arts
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 Lasker ½ ½ ½ ½ 0 ½ ½ ½ ½ 0 0 ½ ½ 0 Capablanca ½ ½ ½ ½ 1 ½ ½ ½ ½ 1 1 ½ ½ 1
FINAL: Lasker 6; Capablanca 9 (10 empates).
Lasker abandona quando restam 10 partidas a serem disputadas
Capablanca 1922 Foto: endgame.nl
Capablanca vs Alekhine. 1927. Buenos Aires. Argentina
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Alekhine 1 ½ 0 ½ ½ ½ 0 ½ ½ ½ 1 1 ½ ½ ½ ½ ½ ½ ½ ½ Capablanca 0 ½ 1 ½ ½ ½ 1 ½ ½ ½ 0 0 ½ ½ ½ ½ ½ ½ ½ ½
21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 Alekhine 1 ½ ½ ½ ½ ½ ½ ½ 0 ½ ½ 1 ½ 1 Capablanca 0 ½ ½ ½ ½ ½ ½ ½ 1 ½ ½ 0 ½ 0
FINAL: Alekhine 6; Capablanca 3 (25 empates).
Capablanca com sua segunda esposa Olga Chagodaev
Capablanca em 1936
Gemalt von Elke Rehder © Elke Rehder Fine Arts
Da mesma forma que os peões inclinam suas cabeças ante o Rei, nós fazemos uma respeitosa reverência ante a genial arte enxadrística de José Raúl Capablanca.
Por Por Frank Mayer – revisado por Salvador Aldeguer
La Habana, maio de 2009
Fonte consultada: Jaime Benédito S
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